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(continuaçâo) Ato 6, cena 13 Em um navio no mar: ouve-se o barulho tempestuoso de turistas afro-americanos e dos delegados à conferência que se escondem. Entram o Capitão do Navio Negreiro e o Funcionário do Setor de Educação do Museu. capitão: Funcionário da Educação! funcionário: Aqui estou, capitão. O que há? capitão: Temos convidados. Dirija-se imediatamente aos guias. Diga-lhes que falem algo politicamente correto ou o museu será coisa do passado. Sai o Funcionário da Educação. Ouve-se retórica nos bastidores. Entra a Equipe de Assistentes do museu, em trajes de marinheiro. Ouve-se uma gravação de uma comunicação lida em Bruxelas por willy bal: Vejo todos estes homens despojados de sua humanidade e depois registrados e considerados apenas como "peças de ébano". Ouço Sua Majestade Cristianíssima lançando seus navios ao mar, numa conquista "das almas e das especiarias". O arcabouço carnal, que encerra as almas, pode ser esvaziado pelo escorbuto e pela disenteria, porque, aconteça o que acontecer, a alma será salva pela graça do batismo. As especiarias, no entanto, precisam chegar a salvo ao porto, com seu sabor intacto e prontas para desencalhar o tesouro real. Ilha de Gorée: pôr-do-sol em um mar encapelado, contemplado entre as barras da cela do cativeiro. O confinamento encarando a infinidade de um horizonte livre. Quem jamais revelará o desespero secreto ou gritante daqueles corações de madeira de ébano?4 Entram o Funcionário da Educação, Alonso, Sebastian, Antonio, Ferdinand, Gonzalo e outros. ALONSO: Você aí. Onde está o capitão? Diga alguma coisa. funcionário: Rogo-lhes que voltem para a sua conferência. ANTONIO: Onde está a teoria? funcionário: Não a ouvem? Os senhores prejudicam nosso trabalho: Não digam nada, os senhores assistem à tempestade. GONZALO: Sabe com quem está falando? funcionário: Quando o mar está como está, o que importam estas ondulações, em nome do rei? Para a conferência e em silêncio! Não nos perturbem! GONZALO: Está bem, mas lembre-se de quem patrocina este navio. FUNCIONÁRIO: Claro, aquele que paga minha viagem, mas para que os senhores estariam me pagando se não fosse para conduzir? O senhor é um membro enfadonho, ordene a estes delegados que fiquem em silêncio. Em seus quartos no hotel, preparem-se para o infortúnio do que está por vir, para o fim da hegemonia ocidental, e agradeçam por seus dogmas terem durado tanto tempo. Saiam de nosso caminho. Sai o Funcionário da Educação perseguido por um gravador. ALONSO: Este sujeito me reconforta: acho que não traz marcas de afogamento; seu aspecto é perfeito para a execução. Não precisamos tomar mais nenhuma atitude, a não ser presenciar seu enforcamento: fazer da corda de seu destino nosso cabo submarino. Se ele não nasceu para ser enforcado, então nosso orçamento foi desperdiçado. Volta o Funcionário da Educação. FUNCIONÁRIO da educação: Mantenham o novo curso. Uma praga nesta embarcação! Eles fazem mais zorra do que o vento ou do que qualquer FUNCIONÁRIO de nosso escritório. ANTONIO: Ele ainda será enforcado, ainda que cada gota dËágua jure o contrário. E escancarem a boca ao máximo para degluti-lo. Um barulho confuso no interior do navio: Tenham piedade de nós!·Nos separamos, nos separamos!· Adeus, minha irmã!·Adeus, irmão!·Nos separamos, nos separamos, nos separamos! sarat maharaj: O Congo está inundando a Acrópole5. ANTONIO: Afundemos todos com o rei. FERDINAND: Vamos nos despedir dele. Saem Ferdinand e os demais. SEBASTIAN: Daria eu mil palavras em troca de um acre [quatro mil metros quadrados] de pintura. Prefiro uma morte seca. Garçom! Saem. 4.Willy Bal, "Confidences dËun wallon †wallonantË etËtiers-mondialisteË", Bulletin de lËAcademie Royale de Langue et Littérature Françaises, n.68 (junho 1990), p.105“115.
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