(continuaçâo)


A força de liderança no grupo era a trinca Jorn, Constant e Dotremont. Vários encontros foram feitos para discutir, festejar e realizar projetos coletivos, publicar revistas, livros e pôsteres. "En la evolución del arte moderno, el período problemático toca a su fin para sucederle un período experimental. Lo que quiere decir que, de la experiencia de que adquiere en estado de desenfreada libertad, se desprenderán las leyes a las que habrá de obedecer la capacidad de creación", escreve Constant3. A primeira grande exposição CoBrA, em 1949, no Stedelijk Museum em Amsterdã, denominou-se "Exposição Internacional de Arte Experimental".4

Em 1951, a revista CoBrA declarou o fim da organização. A razão imediata para o colapso do grupo foi o fato de tanto Jorn quanto Dotremont serem hospitalizados com tuberculose devido à subnutrição e à exaustão física. Durante os dez anos seguintes, pouco aconteceu. O CoBrA foi esquecido. Os artistas dinamarqueses e holandeses ficaram em casa, com exceção de Karel Appel, que se estabeleceu em Nova York. Corneille e Alechinsky se estabeleceram em Paris, onde foram bastante atuantes no meio artístico francês. Somente no início dos anos 60 o CoBrA foi "redescoberto". Jorn afirmou-se no cenário internacional, Alechinsky alcançou a maturidade de seu estilo CoBrA, Appel demonstrou sua dramática pintura gestual. Alguns artistas dinamarqueses, como Pedersen e Jacobsen, logo saíram de seu "exílio" voluntário. Para eles, foi uma surpresa ver os resultados obtidos trinta anos antes finalmente reconhecidos. O ressurgimento da imagética CoBrA deu-se num período dominado pela arte american·pop, minimalismo, conceitualismo. O Cobra representou uma alternativa carregada de espontaneidade, ira (podemos nos referir, novamente, ao Rage maitrisée de Alechinsky), fantasia violenta e poética, que parecia deslocada de seu tempo. A voracidade do desejo está claramente presente em Moment érotique [Momento erótico] (1949), de Constant.

Talvez esse renascimento do CoBrA indicasse com mais precisão um novo início·a nova onda de pintura que explodiu por toda a Europa (e pouco depois em muitos outros países, inclusive no Brasil) no final dos anos setenta e início dos anos oitenta. No entanto, diz Alechinsky, "en 1973, un 1er mai, le grand Jorn disparaît [. . .] Sans Jorn, sans Dotremont, lËéquilibre est rompu [. . .] Aucun survivant, désormais, ne peut prétendre assurer la continuité de CoBrA. Raisonnablement".5 No trabalho de muitos dos pintores alemães dos anos 80, como Baselitz, Penck e Kiefer, referências aos artistas do grupo, especialmente Jorn e Appel, podem ser notadas. Per Kirkeby, como outros artistas dos países nórdicos, claramente constrói suas pinturas tendo Asger Jorn como referência.

O movimento CoBrA teve várias ambições. Nenhuma delas teve sucesso. O programa artístico dos fundadores dinamarqueses do grupo tinha o intuito de promover um aproximação espontânea com a pintura e com uma linguagem pictórica caracterizada por figurações que não se referissem ao mundo "real", mas brotassem da fantasia do artista, reminescentes de formas orgânicas, pássaros, animais, figuras mascaradas. Esse novo expressionismo abstrato foi alimentado por impulsos do cubismo, do surrealismo, de Munch e da arte primitiva, entre outras fontes. Em 1935, Egill Jacobsen já desenvolvia uma linguagem de cruzamento de culturas típica do CoBrA: a "pintura de máscaras". Essa linguagem pictórica, que leva em conta o uso de referências africanas de Picasso e o "desenho automatista" surrealista, evoca diferentes experiências e estados mentais. Durante a guerra, as pinturas de Jacobsen e Pedersen refletem seu medo e depressão, mas também seus lares, exaltando o otimismo, a luxúria, a alegria de viver e os encontros eróticos. Os artistas dinamarqueses viam a arte "primitiva", africana e oceânica, como meio de comunicar fronteiras geográficas e culturais. No entanto, não se interessaram por seus significados religiosos e ritualísticos. Ao contrário, olharam para artistas como Picasso, Miró e Klee, para ver como eles apropriaram linguagens visuais da arte africana e oceânica tradicional.





3. Bert Schierbeek, Los experimentales, Amsterdã: J.M. Meulenhoff, s.d., p.11.


4. Essa idéia de experimentação era tão forte que os artistas CoBrA foram também denominados experimentalistas. Ver o título da monografia de Bert Schierbeek sobre o CoBrA, op. cit.


5. "[. . .] em 1973, em 1o de maio, o grande Jorn desapareceu [. . .] Sem Jorn, sem Dotrement, o equilíbrio se rompeu [. . .] Nenhum sobrevivente, daqui em diante, pode pretender assumir a continuidade do CoBrA. Racionalmente", op. cit., p.20.